terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Formigas

Pressa, pressa em enriquecer
Trocando o Ser pelo Ter
Você olha mas você não vê
Você sabe e não quer entender


Já percebeu? Olhe as pessoas: são formigas, apressadas, sempre preocupadas em cumprir a rotina. E não, não há conexão, não há ligação entre elas. São submissas ao pensamento: Trabalhar, garantir o pão. Trabalhar. Garantir o pão. Trabalhar-garantir-o-pão. Eu acho que deviam ter um lado "cigarra". Nos seus semblantes eu vejo: preocupação, pressa, ganância, sim. Eu vejo, eu vejo a alma delas. Querem mais do que precisam ter. Esbarram umas nas outras, sem sorrir, olham sem ver. Bom dia! Bom dia? Talvez pra você. Isso é muito importante pra ser interrompido. Tenho pressa em terminar, antes que o sol se esconda. Isso o quê? Isso. A busca pelo dinheiro que vale muito. Os números. Isso é importante, eu sei. Isso me trará felicidade depois, talvez. Talvez.

Nunca estão felizes com o que têm, nunca estarão. Porque "tudo" para elas é nada. Elas não sabem que o nada é tudo. Querem mais, mais. Mais-mais-mais. Me dê mais. Dinheiro. Sucesso. Luxúria. O caminho da felicidade? Ou o da morte. Você vê? Não seja como elas, cara, não, não. Você tem tudo, a base. O resto está abaixo. O dinheiro, não, o dinheiro não é o mais importante. Vida estável? Você morrerá e nada em suas mãos levará. Nada. Vê se enfia isso na sua cabeça: você, um mendigo, um rei, um palhaço, uma modelo loira-siliconada, sem excessões, apodrecerão debaixo dessa terra. Todos nós seremos devorados pelos vermes subterrâneos. E todo esse seu dinheiro não te livrará desse destino, não terá mais a mesma importância.

A mudança é precisa, agora, toma seu presente, não me diga que amanhã tudo mudará. Amanhã é outro dia, é incerto. Toma a merda do seu presente. Vou te contar um segredo: você não é eterno. Não se assuste, não me olhe assim, sei que é sinistro. Eu também me assustei. É, cara, não somos eternos. Mas me ensinaram isso: você pode ser eterno se você amar. Amar, acima de tudo. Acreditar. Não é pieguice, cara, acredite: ame. Você vai ficar pra sempre no pensamento de quem você ama. Seu corpo físico, não, múmia, mas sua presença, sim, sua presença será eterna. Vai, cara, preocupe-se com quem você ama. E quem te ama. Dê afeto, dê carinho, dê abraços, dê lágrimas, dê frases. Sim, frases. Não deixe para amanhã, não. Cuida de quem você ama e se entregue aos cuidados. Tenha paciência, acredite.

Olha lá, o pôr-do-sol. Vê o sol manso, tímido, beijando aquela montanha cheia de curvas sinuosas. O céu tá laranja ou vermelho? Sente o cheiro de nostalgia. As formigas, não, não percebem e não enxergam nada. Fingem estar satisfeitas com a beleza superficial que elas mesmas compram. Você vê? Não seja como elas: faça valer cada minuto da sua vida. Sorria, vai. Um sorriso, agora, deixa mais bonito esse momento.

É bem assim, todo ser humano é só, é único. A vida é só uma, cara, você não pode perdê-la assim. Existindo, não vivendo, apenas com intuito de enriquecer. Sem ver o pôr-do-sol, sem sorrir. Vivendo, eu disse vivendo. Viver é amar. Amar é viver. Um dia você vai entender, quando amar de verdade. E quando você for, eu sei, você tem que ir, vai deixar sua marca no mundo.

Patrícia Campidelli.

domingo, 5 de dezembro de 2010

Pecados Inocentes

O cigarro é levado à boca por força do hábito. O vento brinca com seus cabelos ruivos. Praia, cigarros, um violão. Rock 'n' roll. Sex, drugs and beach. Bitch.

A espanhola. Com seu andar dançante, a espanhola é quente. Muy caliente. Inspirando sexo, a medida em que se aproxima o cheiro de luxúria fica mais forte. Eu gosto de música, ele disse. Ela tira o rádio da bolsa. Começa a dançar. Seu corpo, feito pro pecado, começa a se mexer sensualmente. Cobra venenosa, serpente gulosa, pronta pra destilar seu veneno. Veneno doce. Aqueles olhos de cigana, famintos, penetram o fundo da sua alma e parecem deixá-lo completamente nu. Seu olhar o despe sem pudor. Ela pega seu cigarro e o traga, como se estivesse tragando Tony. Os lábios gulosos não disfarçam sua sede. A fumaça separa suas bocas.

Uma mão máscula acaricia aquele rosto. O rosto de Tony. Os olhos dele são mais atraentes, penetram mais fundo. Os lábios dele são mais carnudos. Sua boca está sedenta, promete prazeres ocultos, prazeres proibidos. Ele queria usufruir o proibido. O corpo dele foi feito para Tony. O que podia fazer? Aquele corpo esculpido e másculo o atraía mais que o corpo quente e sinuoso da espanhola. A verdade é que o corpo dela não o atraía. Era sua alma, a culpada. Sua alma desejava a carne. Desejava um corpo idêntico ao seu

Não é o certo, diziam. Homem foi feito para mulher. Mulher para homem. Não é certo. Quem eles são para dizer o que é certo ou errado? Está na bíblia, diziam. Eu sou um pecador. Eu sou anormal. Eu sou um mutante. Eu sou uma vergonha. Os meus gostos são proibidos. A minha vontade é proibida. A sociedade dita seus gostos, suas preferências. Ela diz o que você deve enxergar, como deve agir. A sociedade dita o que você deve ser. Os monstros são os autênticos, os que assumem sua própria personalidade. Eles são errados, eles são pecadores. Porque não seguem o que a merda da sociedade diz ser certo. Perdoe-me, pai. Eu sou assim, mãe. Me perdoem se sou uma decepção. Um erro, talvez. Eu sou o que sou e não vou mudar. Nem esconder. Não vou deixar de ser autêntico por ninguém. Aceito a sina de ser o monstro, a anormalidade, a vergonha dessa tal sociedade. Hipócrita. Sociedade hipócrita.



Inspirado em uma cena de "Pecados Inocentes", drama dirigido por Tom Kalin.

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

Dois caminhos. Morte e vida. Inferno e céu.

Ar tenso. Palavras rasgadas explodem transformando-se em silêncio. Ela pode ouvir os dois corações batendo, juntos. Sempre juntos. Ele só queria uma palavra. Tão curta e simples, mas que poderia mudar o cheiro das rosas. Os olhos dele tentam encontrar os dela. Eles fogem. Olham para o horizonte, sem ver. Ele sabe que em seu pensamento há destroços, sofrimento, confusão, angústia. E era verdade. Ela se vê há um passo do abismo, prestes a cair.

Ficar um tempo sozinha no escuro. Sentir o gosto da dor, o gosto da separação. Como? Que bobagem, meu Deus! Por que a gente sempre quer experimentar a dor quando tudo vai bem? Seus olhos não suportam o peso de suas pálpebras, ela comprime os lábios e luta contra aquela dor que aperta o peito. Aperta, aperta, aperta e explode. Ela é vencida. Lágrimas teimosas escorrem por sua face e fogem. Fraca quando mais precisa ser aquela menina forte e fria.

Estava claro: ela tinha nada e ninguém até encontrá-lo. E ele se tornou sua fonte de vida. Era o motivo, motivação. Agora ela tinha que escolher entre duas pequenas palavras. Gigantescas naquele momento. Sim e não. Dois caminhos. Morte e vida. Inferno e céu. O "sim" deixaria sua vida escorregar por entre suas mãos como areia. Ela perderia o ar, perderia a vida. O "sim" roubaria tudo e deixaria para ela apenas a existência. Existir não é viver. E o "não". O "não", por mais negativo que fosse, manteria a sua fonte de água. A paz, a felicidade. Felicidade que teria defeitos vezenquando. Ou a todo instante.

Ele sabia o significado das lágrimas. Então seus braços enlaçam aquele corpo tão pequeno. Ela se viu minúscula diante do maior homem do universo. E suas lágrimas foram secadas por aquelas mãos tão compreensivas e tão queridas. Não. Eu não quero e não posso te deixar. Agora, era tudo doce. Não. Doce, bom pro coração. Não. Deixando doce o abraço, o beijo, o amor. Doce. Não. Será. Doce.